Abraão e Ló
A história de Abraão e Ló está registrada no livro de Gênesis. Esses dois homens simbolizam dois estilos de vida que identificam o homem em sua relação com Deus: o homem carnal e o homem espiritual, o crente derrotado e o crente vencedor. Todos os crentes, diz-nos a Bíblia, são vencedores – na verdade, mais que vencedores. Mas, contraditoriamente, muitos vivem como derrotados. Legalmente, são donos de uma grande herança, mas não usufruem dela.
Muitos crentes vivem uma vida cristã sem compromisso com o reino de Deus e, mesmo assim, ainda se declaram vencedores. O fato de sermos salvos faz-nos legalmente vencedores, visto que, uma vez salvos, precisamos manifestar essa vitória em nossa experiência. Traçando um paralelo entre as vidas de Abraão e Ló, observamos o padrão de Deus para o crente vencedor. Tanto Abraão quanto Ló eram homens de Deus e suas vidas representam, para os nossos dias, grandes sinais proféticos.
Podemos destacar nas vidas de Abraão e Ló, pelo menos sete aspectos importantes:
1) Abraão ouviu Deus, e Ló seguiu Abraão.
Em Gênesis 12, Deus chama Abraão e faz-lhe grandes promessas. Abraão ouviu o chamado de Deus e obedeceu. Quanto a Ló – não há menção de que Deus o tenha chamado – diz-se apenas que ele seguiu Abraão. Muitos de nós, em nossa vida cristã, ouvimos Deus por tabela, ou seja: Deus fala com um irmão abençoado, e nós seguimos esse irmão, em vez de ouvirmos Deus diretamente. É mais cômodo seguir o líder, o profeta ou o irmãozinho mais experiente. Não estou dizendo que não devemos ouvir Deus através de nossos líderes. O que eu quero dizer é que os líderes deveriam apenas confirmar aquilo que Deus falou conosco. O crente vitorioso é aquele que aprendeu a ouvir Deus e que faz a vontade divina. O derrotado, por sua vez, segue o líder, a multidão, a onda, a moda...
Não há como alcançar uma vida de vitória através de profetas, videntes ou algo parecido. Eu creio em profecia, mas não creio que um crente deva ir atrás de um profeta para ouvir Deus. Se agirmos assim, estaremos apenas espiritualizando o antigo costume de procurar adivinhos e/ou cartomantes. Se Deus quer falar com você através de um profeta, Ele certamente mandará esse profeta até a sua casa. E, caso isso aconteça, o profeta apenas confirmará algo que Deus já falou a você, no seu íntimo.
.Isto é andar pela vista, sem depender de Deus. Não podemos condená-lo pela escolha feita. Muitos de nós também temos tomado decisões semelhantes, simplesmente olhando para o campo mais verde. Ser crente não significa ser bobo e inconseqüente, escolhendo sempre a pior opção. Todavia, os espertinhos não são mais fiéis por causa de sua esperteza.
Embora as circunstâncias pareçam óbvias, é preciso orar. Mesmo que pareça completa estupidez não fazer aquele negócio lucrativo, é preciso ouvir Deus antes de tomar qualquer decisão. Não confie na sua capacidade própria. Não confie no natural, nem se deixe guiar pela lógica humana.
Ló andou pela própria vista e foi parar em Sodoma. Ele não foi para lá de uma vez, mas aos poucos. Gênesis 13.12 diz que armava suas tendas de lugar em lugar, até chegar a Sodoma. Tomamos uma decisão inteligente hoje, uma mais esperta amanhã e, aos poucos, direcionamos nossas vidas para Sodoma. O resultado de confiar na força e no entendimento próprio é o pecado de Sodoma.
Um grande problema do cristianismo, em nossos dias, foi ter transformado a vida cristã numa questão meramente moral. Deus não quer fazer de nós homens bons, simplesmente. Ele quer fazer de nós homens que tragam a natureza divina dentro de si mesmos. Não é uma questão de saber o que é certo ou errado, mas saber qual é a vontade de Deus. Diante de uma situação qualquer, podemos avaliar e concluir que a nossa conduta não é pecaminosa, dolosa ou antiética e, ainda assim, estarmos errados por não ser aquela a vontade de Deus. O entendimento próprio é um grande empecilho a uma vida de vitória. Jamais teremos vitória, confiando em nosso bom senso e inteligência.
3) Abraão habitou em tendas; Ló na cidade de Sodoma.
– Por que morar em tendas – refletiu Ló –, se há uma cidade aqui perto, onde terei mais proteção, conforto e diversão?
O que há de errado em morar numa cidade? O entendimento próprio é carne, e o que nasce da carne nunca pode transformar-se em algo do Espírito. O problema é que, habitar em tendas, naqueles dias, fazia parte do mover de Deus, da contracultura ao sistema vigente e da disposição de agradar a Deus. Fora da vontade e do mover de Deus, toda decisão ou atitude humana é errada, dolosa e antiética.
Por que Abraão habitava em tendas? Hebreus 11.9-10 nos dá a resposta: “Pela fé Abraão peregrinou na terra da promessa, [...] habitando em tendas [...] porque aguardava a cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e fundador.”
Habitando em tendas, Abraão estava assumindo uma atitude profética: mostrava sua fé e esperança em Deus. Era também uma forma de, naqueles dias, não se contaminar com o mundo. Recentes descobertas arqueológicas confirmam que cada cidade, naquela época, era consagrada a um deus, e que os habitantes dessas cidades eram obrigados a adorá-lo. Talvez seja este o motivo de os patriarcas terem habitado em tendas. Era uma forma de testemunhar de Deus e rejeitar a idolatria. Se desejarmos ser crentes vencedores, é necessário assim como Abraão, estar em harmonia com o mover de Deus em nossos dias, ainda que, aos padrões do mundo, pareça algo ilógico.
4) Ló foi levado cativo; Abraão libertou-o.
No capítulo 14, Ló envolveu-se numa guerra e foi levado cativo. Para libertar o sobrinho, Abraão também teve que se envolver. O crente carnal sempre dá trabalho aos espirituais. Os espirituais têm problemas, mas os carnais são um problema ambulante.
Tudo aconteceu porque Ló estava no lugar errado, na hora errada. O entendimento próprio nos leva para fora da vontade de Deus e, nessas circunstâncias, podemos sofrer perdas desnecessárias.
O mais impressionante é que não vemos Ló agradecendo a Abraão, como o fazem os outros reis ímpios. E o pior, Ló voltou a morar em Sodoma. Aquela experiência não lhe serviu de lição, visto que já estava acostumado com o pecado da cidade.
5) Deus fala com Abraão; Ló não conhece o mover de Deus.
No capítulo 18, Deus resolve destruir Sodoma e decide não esconder o fato de Abraão.
– Ocultarei a Abraão o que estou para fazer? (Gn 18.17).
Antes de Deus agir, Ele compartilha os seus planos. Mas com quem? Somente com o crente espiritual.
O profeta Amós levanta em confirmação, dizendo:
– Deus não fará coisa alguma sem antes revelar os seus planos aos seus servos (Am 3.7).
Enquanto Abraão compartilhava do coração de Deus, Ló estava completamente alheio e indiferente ao que acontecia. Não se diz que Deus tenha compartilhado seus planos com ele.
Deus tem agido em nosso meio. Mas, quantos percebem o mover do seu braço em nossos dias? Há uma intensa agitação no mundo espiritual, mas muitos de nós estamos dormindo tranqüilamente como Ló, em Sodoma, à beira da destruição.
6) Ló foi salvo pela intercessão de Abraão.
Como foi dito, Ló foi armando suas tendas cada vez mais perto de Sodoma. Na verdade, ele se deixou arrastar para aquela cidade (Gn 19.16). Embora tomasse conhecimento do que Deus faria à cidade, Ló ainda demorou-se para obedecer à ordem divina para sair de lá. Muitos crentes também são assim: tardios em obedecer a Deus. Ló foi salvo da destruição. No entanto, qual é o testemunho que se pode dar a seu respeito? Quase nenhum.
Quando estava prestes a destruir Sodoma, Deus lembrou-se de Abraão, e salvou Ló (Gn 19.29). Que coisa impressionante! Ló foi salvo pela intercessão do homem espiritual. Deus salvou Ló por causa de Abraão. O vencedor entra no céu, mas o crente derrotado vai como que arrastado.
7) Abraão gerou Isaque; Ló gerou Amon e Moabe.
No final da vida destes dois homens, vemos os frutos finais. Abraão gerou Isaque que simboliza Cristo e o propósito final de Deus para a vida do homem. O alvo de Deus é que, no final, cada um de nós expresse Cristo em nossas vidas para que o mundo o veja.
Por outro lado, em Gênesis 19.30-38, lemos que Ló gerou Amon e Moabe. Dispensa comentários a forma incestuosa como Ló – com as próprias filhas – gerou esses filhos. Mais importante é o fato de que, tanto a Amon quanto a Moabe, foi-lhes vedado o direito de fazer parte da congregação de Israel (Leia Deuteronômio 23.3). Em conseqüência disso, tornaram-se inimigos do povo de Deus por todos os seus dias. Amon e Moabe apontam para o fruto da carne, podre e vergonhoso. Que fim melancólico para um servo de Deus!
Temos diante de nós dois caminhos: o da carne e o do Espírito. O caminho da carne é derrota, o do Espírito é vitória. Alguns dizem: “Para mim, basta a salvação.” Mas não nos esqueçamos de que cada um de nós prestará contas de si mesmo diante de Deus. A vontade de Deus não é apenas ter um monte de mundanos salvos. A vontade de Deus é que completemos a nossa carreira, guardemos a fé e combatamos o bom combate de Cristo.